Hoje não...

E hoje eu não queria flertar, apenas observar, analisar o comportamento dela. Quando ela dançava eu não conseguia parar de olhar. Estava hipnotizado pelo seu rebolado, pelo salto alto, pela saia preta e blusa cinza, pelos cabelos ondulados de pontas crespas. Coisas rara de se ver na era do alisamento, progressiva, permanente e chapinha da maioria delas.

Eu poderia ter ido até lá, o não já estava garantido com a falta de atitude. Mas hoje a atitude era diferente, era de observador, de alguém que já teve muito a fome saciada, que o somatório já não somava mais. O que soma é a qualidade, e essa é imensurável. Embora ela tivesse muita qualidade, hoje era dia de olhar nos olhos e não sorrir.

Um amigo levantou a mão, acenando de uma lado para o outro, no ritmo da música. Ela nos olhou e sorriu, como quem está para novos amigos, mas hoje eu não podia. Hoje eu tinha que ver ela partir sem nunca saber seu nome, sem nunca mais ver os olhos cor de mel vistos de cima, daqueles mais que 1,70m de altura. Eu já estava sentado, olhando discreto.

Poucas vezes ela dançava girando em torno de si mesma, observando toda a sua volta. Nesse momento ela sabia que eu estava observando tudo, dos pés a ponta dos cabelos. Fiquei imaginando se ela era estudante de medicina, não tirei isso da cabeça.

Sem me despedir dos amigos, como um mágico, fui percolando na multidão e sumi. Entrei no carro, dirigi de forma injusta e cheguei rápido em casa. Entrei no quarto e fui tentar sonhar com ela. Talvez no sonho eu descobrisse qual seria a atitude dela ao saber o que eu já sabia dela.

Jonata Biehl

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